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03/04/2025

Negócios à prova de uma geopolítica fragmentada

No xadrez da economia global, há momentos em que o tabuleiro se desloca sob nossos pés. As peças não mais obedecem à lógica anterior e o que antes era certeza torna-se dúvida. Liderar, então, deixa de ser uma questão de administrar variáveis conhecidas: torna-se um exercício de lucidez diante de um mercado fragmentado, marcado por interesses múltiplos — e, por vezes, antagônicos. Vivemos um desses momentos.

De um lado, financiadores e bancos europeus intensificam a cobrança por relatórios transparentes sobre sustentabilidade, metas climáticas detalhadas e planos de longo prazo que combinem consistência com ambição. Do outro, o presidente dos Estados Unidos estimula o abandono de compromissos ESG, reforçando uma retórica que valoriza a soberania empresarial diante de regulações externas. As empresas, no centro desse campo de tensões, não podem se permitir a inércia. Tampouco a improvisação.

O desafio está posto: como definir um curso de ação quando há múltiplas direções sendo indicadas e pouca ou nenhuma convergência?

Enfrentar essa realidade exige mais do que alinhamento automático a uma ou outra expectativa. Requer compreensão profunda das dinâmicas em jogo. Não se trata de escolher entre Europa e Estados Unidos, entre transparência regulatória e flexibilidade estratégica. Trata-se de reconhecer que a fragmentação do mercado é um reflexo da fragmentação política global — e que os negócios, enquanto entidades vivas, precisam aprender a operar nesse novo contexto com resiliência e inteligência.

A Europa, em processo de reavaliação dos seus vínculos com os Estados Unidos, responde à crescente instabilidade geopolítica com urgência. A cúpula que reúne líderes do bloco em Bruxelas nesta semana — a terceira em apenas seis semanas — expõe a gravidade da situação. A geopolítica já não é pano de fundo: tornou-se protagonista.

A resposta não está em buscar agradar a todos, tampouco em ceder às pressões mais estridentes. Está em construir posicionamentos sólidos, fundamentados em dados e coerência entre discurso e prática — seja no campo ambiental, seja na condução de investimentos. Em ecossistemas fragmentados, o verdadeiro diferencial é a capacidade de manter a integridade diante da instabilidade.

Não há solução fácil. É justamente em contextos tão complexos, porém, que se formam lideranças de verdade. A fragmentação de interesses não deve ser vista como obstáculo absoluto, e sim como oportunidade para inovação estratégica.

As empresas que souberem interpretar esse momento de incerteza com lucidez e agir com coerência não apenas resistirão às pressões externas, como estarão aptas a prosperar — transformando a complexidade do cenário em vantagem competitiva. A história já nos mostrou, repetidas vezes, que não são as circunstâncias que definem o destino de uma organização — e sim a qualidade da liderança que a conduz. O futuro pertence aos consistentes.

Por: Luciana Zanini, Diretora Executiva de Finanças, Pessoas e Estratégia – CFO do Inhotim.