O Governo Federal, ao apresentar a proposta da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2026, admitiu publicamente algo que os números já vinham sinalizando: a trajetória fiscal brasileira é insustentável nos moldes atuais. A projeção de que, em 2027, o orçamento discricionário cairá para R$ 122 bilhões – dos quais cerca de R$ 50 bilhões já estarão previamente comprometidos – é mais que um dado técnico. Trata-se de uma evidência clara de que o Estado caminha para um ponto de estrangulamento, no qual não conseguirá mais manter seu funcionamento mínimo sem rever regras, compromissos e expectativas.
Ao observar essa previsão, o que se desenha não é apenas um aperto temporário, mas sim a materialização de um desequilíbrio estrutural. A raiz do problema está na rigidez orçamentária do setor público brasileiro. Com cerca de 94% do orçamento já comprometido com despesas obrigatórias – como previdência, folha de pagamento, transferências constitucionais e pagamento de dívidas –, o espaço para alocação discricionária vem sendo comprimido ano após ano. Essa compressão não é sustentável e 2027 surge como um divisor de águas: será o ano em que o modelo de gastos obrigatórios sem contrapartida de reformas poderá inviabilizar o funcionamento do Estado.
O agravante é que, a partir de 2027, os precatórios voltarão a contar no resultado primário, o que adiciona uma pressão fiscal ainda mais intensa. Com isso, o governo será confrontado com a necessidade de honrar obrigações judiciais acumuladas, sem poder utilizar o mecanismo de postergação que vigorou até aqui. O desafio, portanto, não é apenas técnico, mas político e institucional: como conciliar a rigidez constitucional das despesas com a necessidade de manter o Estado funcionando de maneira eficiente e minimamente sustentável?
A resposta não está em previsões otimistas de crescimento ou em aumentos pontuais de arrecadação. A resposta está em reformas estruturais. É necessário revisar o desenho do Estado brasileiro, desde a política de vinculações obrigatórias até a forma como os tributos são arrecadados e distribuídos. Sem isso, qualquer projeção de equilíbrio fiscal será ilusória. A manutenção da credibilidade do arcabouço fiscal passa menos por regras e metas, e mais por coerência entre os compromissos assumidos e a capacidade de financiá-los.
A antecipação da crise – reconhecida agora de forma explícita no discurso oficial – pode ser um gesto de honestidade institucional. Mas, sem reação concreta, esse reconhecimento se converterá apenas em mais um capítulo de um ciclo recorrente na história econômica do país: promessas de responsabilidade fiscal seguidas por déficits crescentes e improvisações de última hora.
O Brasil não precisa esperar 2027 para saber o que fazer. As soluções estão dadas: reestruturar o gasto público, racionalizar o sistema tributário e reconectar o Estado com a realidade orçamentária. O que falta, como em tantos outros momentos da nossa história, é vontade política de enfrentar o desconforto das reformas antes que o colapso fiscal torne essa decisão uma imposição inevitável.
• Por: Hugo Garbe, professor de Ciências Econômicas da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM).|*O conteúdo dos artigos assinados não representa necessariamente a opinião do Mackenzie. | Universidade Presbiteriana Mackenzie
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