O título do presente texto e reflexão decorre da junção dos títulos de dois grandes filmes do gênio Charles Spencer Chaplin, ou simplesmente Charles Chaplin: O Grande Ditador e Tempos Modernos. Contando-se das datas de seus lançamentos, O Grande Ditador de 1942 e Tempos Modernos de 1936, têm 83 e 89 anos, respectivamente, aproximando-se ambos de um Século.
O primeiro é crítica inteligente ao regime nazista e, de fato, a todos os regimes fascistas ou Nazifascistas. Regime opressor cuja figura central é vista como ser ungido, considerado e idolatrado como se fora semideus pela massa de manobra absorta e crédula nas falácias e promessas vãs, em sua maioria. Massa débil de ideias e ideais e, em alguns casos, débeis fisicamente, ou seja, não só fraca mentalmente, mas do corpo também. Aquele que detém o poder se sente e age, efetivamente, como semideus acima de tudo e de todos, geralmente com suporte nas armas, mas pode ser, também, em razão de um parlamento frágil e corrompido moralmente.
O segundo é crítica mordaz ao sistema capitalista voraz que, utilizando-se de processos mais complexos de produção, notadamente de máquinas, absorve corpo e mente dos operários, moendo-os juntamente com a matéria prima necessária à produção, exaurindo-os e não lhes concedendo tempo, dada a frenética forma de produção. Não lhes é permitido pensar ou agir de modo diferente do que lhes é imposto pelo sistema produtivo, ou seja, de agirem como melhor lhes aprouver ou caminhar a seu modo, com os próprios pés. Chaplin certa vez disse que, apesar dos grandes avanços da tecnologia, de conhecimentos obtidos até então, a sociedade, na sua grande maioria, esqueceu-se de alguns essenciais valores que nos torna diferente dos demais seres, como a solidariedade, a fé e o amor, seja próprio ou devotado a terceiros. Não pretendeu jamais dizer que a tecnologia deveria ser alijada da vida moderna, nem poderia, pois dela se utilizou para gerar filmes, mas visava chamar atenção para a aliança necessária entre tecnologia e valores sociais, morais, enfim valores humanos.
Os poetas modernos, Cazuza e Arnaldo Brandão, escreveram: “Eu vejo o futuro repetir o passado”, nada mais certo, nada mais atual. O avanço tecnológico, a par de todos os benefícios trazidos ao nosso dia a dia, essenciais, sem dúvida, assim como retratado por Chaplin, tornou muitas pessoas ou a grande maioria da população mundial quase que em autômatos, servos e não senhores da tecnologia. Assim como o pobre operário retratado no filme, são movidos e moídos celeremente na busca frenética pelo poder, riqueza, pelo modo de vida que desfrutam de forma apenas parcial, pois, para isso, voltam-se constantemente e de forma dependente, diuturnamente exaurindo seu tempo ou grande parte dele justamente no uso ou com o uso da tecnologia. Além do tempo, exaurem a sua capacidade de mobilidade e intelectual. Neste caso, muitos são levados a crer que não precisam mais pensar, ler, estudar, pois a denominada inteligência artificial, inquestionavelmente de muita valia, pode pensar por eles, ou seja, como narrado pelo grande escritor Russo Fiódor Dostoiévski, in O adolescente. Romance publicado em 1875, Século XIX, portanto, mas tão atual, apesar de vivermos no XXI: “Os dias de hoje são a época da mediocridade e da insensibilidade, da paixão pela preguiça, pela incapacidade de agir e pela necessidade de agir e pela necessidade de tudo pronto. Ninguém faz uma reflexão; seria raro alguém capaz de suportar uma ideia.”
Desde a chamada revolução industrial, vive-se no modo de produção capitalista altamente dependente de tecnologia e conhecimento, buscando-se freneticamente por novos e diversos produtos ou serviços, notadamente as chamadas novas tecnologias, desta forma, como no passado, qualquer empecilho ao avanço tecnológico e seu uso, torna-se entrave a produção de riqueza, inaceitável no capitalismo, pois ele se alicerça justamente no acúmulo de riqueza, sendo também notório que, em razão disso, gere enormes desigualdades, o que provoca em regimes democráticos, na sua grande maioria, esforços voltados para a criação de mecanismos de distribuição de renda e proteção aos mais necessitados, além da inserção e liberdade dos diferentes.
Determinados chefes de Estado, levados ao poder pelo sufrágio lícito ou fraudado, ou pela imposição da força, repetem atos autoritários, permeados diretamente pelo fascismo, seja na intenção ou na efetiva ação. Entendem, ao que parece, que os erros, alguns atrozes, cometidos no passado não foram cometidos por eles, natural, portanto, segundo pensam ou deixam transparecer, que fariam e farão tudo diferente, apesar de repetirem de forma simétrica ou com nova roupagem ou maquiagem, as mesmas ações e atos já perpetrados no passado. Na política interna, como tantas vezes se viu no passado, buscam sobrepor e manter a vontade de uma minoria sobre a maioria, reprimindo com extrema violência qualquer ato que lhes seja contrário, sendo um dos reflexos modernamente visto o massivo deslocamento humano em busca de melhores condições de vida, notadamente da liberdade que lhes foi sórdida e abruptamente roubada. Embora a ditadura esteja centralizada em determinada pessoa ou figura, a gestão é partilhada pelos poucos que se aglutinaram em torno daquela, não se permitindo questionamentos por parte de representantes da maioria ou da sociedade. No tocante a política externa busca anexar territórios de outros Estados livres e soberanos, mediante uso de armas, da guerra, como tantas vezes se viu no passado recente ou remoto, ou manifestam desejo de fazê-lo. Quando não põem em prática esse ato condenável, ou seja, a invasão física, invadem de forma sub-reptícia através da influência política local ou regional, ou fazem uso de tecnologia ou até mesmo, como visto recentemente, por imposição de taxações ou outros mecanismos de comércio exterior, atropelando regras, tratados, convenções advindas ou não da Organização Mundial do Comércio – OMC, visando estrangular a economia do Estado considerado, conforme o grau de sandice do chefe de estado, como inimigo.
Não se pode transigir com a defesa da democracia sob o risco de, como no passado, cairmos no populismo, no fascismo. Hoje há o uso avassalador das denominadas mídias sociais, seja para o bem ou para o mal. O uso para o mal ou de forma inapropriada tem levado pessoas a se digladiarem virtualmente e, em alguns casos, levadas até as vias de fato. Utilizam-se os diversos meios colocados à disposição pela tecnologia para disseminar inverdades, impropérios, disseminar o ódio. Neste contexto, concluindo-se, cabe transcrever pensamentos expostos pelo Doutor, Professor e Filósofo José Arthur Gianotti: “Aquele que está sempre em conflito entra para criar conflito, para identificar quais são seus inimigos. É uma política que aglutina certo grupo de pessoas incapazes de ver a modernidade, que transforma os diferentes em inimigos. A política deveria ser a contenção da guerra. Na democracia uns ganham outros perdem e vice-versa. A democracia não exclui o conflito, mas civiliza o conflito. O que está acontecendo no mundo hoje é que nós temos a política como incentivo ao conflito. O insulto é a repetição daquele ato do general espanhol que dizia quando falam em cultura imediatamente eu pego meu revólver.”
• Por: Menildo Jesus de Sousa Freitas, mestre em Contabilidade., professor, livre pensador., perito Contador aposentado do MPU.