O trabalho prestado por meio de plataforma digital está longe dos parâmetros tradicionais de uma relação de emprego para que possa receber o enquadramento de trabalhador celetista e, de outro lado, está distante da absoluta autonomia na forma de prestar serviços. Deste modo, trata-se de prestação de serviços que permanece no limbo jurídico e sem definição clara quanto à lei aplicável.
O STF (Supremo Tribunal Federal realizou audiência pública nos dias 9 e 10 de dezembro, a fim de que 58 expositores pudessem manifestar-se em torno do enquadramento jurídico possível.
Chamou a atenção a participação do ministro Aloysio Corrêa da Veiga, presidente do TST e do Conselho Superior da Justiça do Trabalho que destacou, em sua intervenção, com serenidade peculiar, a importância do diálogo para a melhor pacificação dos potenciais conflitos. Dados apresentados pelo ministro, desde 2014, a Justiça do Trabalho recebeu 21.275 processos em que se discute a natureza da relação jurídica do trabalho por meio de aplicativo entre os quais 6.857 foram julgados improcedentes, 2.242 parcialmente procedentes e somente 189 totalmente procedentes.
Observou sua Excelência, o presidente do TST, que assistimos a um fenômeno decorrente da reestruturação das formas de trabalho na sociedade, afirmando que “o desafio é o debate sobre a relação jurídica numa divisão binária entre ser empregado ou prestador de serviços”. Aqui, talvez, esteja o grande dilema e a dificuldade: sair do padrão e encontrar uma forma de proteção social.
Foram manifestações de trabalhadores, sindicalistas, magistrados, economistas, sociólogos, advogados, professores e partes envolvidas diretamente no caso, na busca de melhor informar nos autos com suas experiências práticas estudadas e vividas sobre o caso. Foram trazidos dados estatísticos relevantes sobre o setor de atividade, número de trabalhadores que se utilizam do sistema, valores médios de ganhos e de horas dedicadas ao trabalho.
Ao final, parece que todos têm razão nos seus argumentos, mas de saída para o impasse pouco se viu, dado que as posições de cada expositor foram defendidas como inegociáveis, fechadas em seu universo de interesses.
Não faltaram referências à legislação estrangeira, em especial à portuguesa e espanhola.
A União Europeia, em 24 de abril de 2024, aprovou a Diretiva 2024/2831, publicada em 23 de outubro de 2024, relativa à melhoria das condições de trabalho em plataformas digitais. A diretiva está baseada na promoção do bem-estar “de todos trabalhadores e no direito a condições de trabalho justas e equitativas que respeitem a sua saúde, segurança e dignidade”.
O Pilar Europeu de Direitos Sociais em que se baseia a diretiva também estabelece o direito dos trabalhadores à informação sobre seus direitos e obrigações, bem como prevê o reconhecimento do direito de conhecer os fundamentos da despedida e o direito defesa.
Sobre o trabalho por meio de plataformas digitais, remete ao elevado grau de heterogeneidade dos tipos de plataformas e do campo de atuação.
Entre nós, o caminho para onde vamos poderá ser apresentado pelo STF e o enfrentamento está nas palavras do ministro Aloysio Corrêa da Veiga: “o desafio é o debate sobre a relação jurídica numa divisão binária entre ser empregado ou prestador de serviços” e o encontro de uma solução intermediária com base na proteção social, respeitando a heterogeneidade dos modelos.
• Por: Paulo Sergio João, advogado e professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.