Acostumado a ver a sua economia impactada por desastres naturais em outros países, como a China, cujo papel é vital na cadeia global de suprimentos, o Brasil experimentou um evento climático de grandes proporções com reflexos em sua produção agrícola e industrial, nos transportes e no crescimento nacional. A tragédia no Rio Grande do Sul evidenciou o grave problema de infraestrutura logística do país.
No caso das rodovias, no auge da crise, o Estado chegou a registrar mais de 400 pontos de bloqueio parcial ou total, em mais de 13 mil estradas estaduais e federais. Hoje, dois meses após as enchentes, 76% dos pontos já foram liberados, segundo a Secretaria de Logística e Transportes do Rio Grande do Sul, embora ainda haja desafios a serem enfrentados.
No setor portuário, por exemplo, o acúmulo de grandes quantidades de detritos e sedimentos carregados pelas águas provocou a redução do calado do Porto de Rio Grande, que desde 14 de junho perdeu cerca de dois metros de profundidade, passando de 14,2 metros para 11,9 metros. Além de reduzir a capacidade de carga dos navios, o assoreamento do canal de acesso ao porto vem obrigando as embarcações de maior porte a um desvio de rota para outros portos, que também enfrentam problemas que se arrastam há anos.
Por falta de investimentos, o maior porto de contêineres do Brasil, o de Santos (SP), está à beira de um “colapso”, e já vemos a migração de grandes navios conteineiros para o Porto do Rio de Janeiro e até para o Espírito Santo, que obteve uma aprovação emergencial da ANTAQ (Agência Nacional de Transportes Aquaviários) para operar esse tipo de carga. Os navios têm esperado mais de 20 horas para aportar no cais santista, tempo que dobrou em relação à média dos últimos anos e que eleva o custo logístico.
Isso ocorre por uma série de fatores que reduziram a capacidade do porto santista e de outros terminais da região, e que requer uma ampliação urgente para dar conta da demanda projetada. Os problemas começaram com o fim da operação no Porto de Itajaí (SC), em 2022 e se agravaram com a redução de 3 para 2 pontos de atracagem no Terminal de Navegantes, que entrou em obras em janeiro deste ano; e pelo incidente com um navio, no início do ano, que impediu por alguns meses a operação em um dos três berços de atracação do BTP, maior terminal de contêineres de Santos.
Quando a mercadoria precisa percorrer 2 mil quilômetros de caminhão até encontrar um Porto com disponibilidade de exportação isso implica um custo enorme não previsto nas cadeias logísticas das empresas brasileiras. Se este custo é resultante de um fator extraordinário pode ser ocasionalmente absorvido, mas quando estas dificuldades são recorrentes e resultado de fatores perenes, como a falta de investimentos, isso encarece os produtos do Brasil no exterior, afetando a competitividade e fazendo com que os brasileiros paguem mais caro pelos produtos importados que consomem.
Sem falar nas dificuldades de acesso terrestre que também expõem outro gargalo logístico do Brasil: a dependência excessiva do transporte rodoviário. Muitas vezes precárias, as rodovias não são suficientes para suportar o volume de carga que precisa ser transportada principalmente do interior. Imagens de caminhões bloqueados em estradas lamacentas só porque choveu um pouco mais são recorrentes e representam um custo que, no final, vai ser pago pelos mesmos: exportadores e consumidores brasileiros.
Investimentos em manutenção e construção de novas rodovias são essenciais para garantir um transporte mais seguro e eficiente. Outra alternativa é ampliar a malha ferroviária, que tem potencial enorme de mover grandes volumes de carga a longas distâncias de forma mais econômica e sustentável, e hoje é subutilizada. Projetos como da Ferrovia Norte-Sul e a Ferrogrão são bons exemplos de iniciativas que podem transformar a logística no país e que devem ser multiplicadas.
O Brasil é um país de dimensões continentais que precisa de um sistema de transporte multimodal bem integrado para maximizar a sua eficiência logística, com rodovias, ferrovias, hidrovias e portos funcionando em sinergia. A criação de corredores logísticos que conectem os diferentes modos de transporte pode reduzir significativamente os custos e o tempo de movimentação da carga. Além disso, o desenvolvimento de centros de distribuição próximos a esses corredores facilitaria o escoamento e o armazenamento das mercadorias.
A melhoria da infraestrutura logística terá impacto direto na competitividade das exportações brasileiras. Produtos agrícolas, minérios e manufaturados enfrentam atualmente dificuldades para chegar aos mercados internacionais. Com o aprimoramento logístico, os custos de exportação diminuiriam, tornando os produtos brasileiros mais competitivos no exterior. Da mesma forma, a importação se tornaria mais eficiente, melhorando a produtividade e reduzindo os custos de produção.
Não podemos esquecer que o Brasil está muito longe dos principais centros consumidores mundiais. Chegar à Europa, Estados Unidos ou Asia é mais difícil para o Brasil do que para os seus concorrentes diretos. A melhor forma de “aproximar” o Brasil destes mercados é reduzindo o custo logístico e isso só pode ser feito com investimento em corredores e infraestrutura.
A necessidade de um salto logístico é flagrante em face do nível atual da industrialização do país. É urgente investir na modernização e ampliação dos portos, na melhoria das rodovias e ferrovias e na integração multimodal para eliminar os gargalos existentes e impedir que outros surjam no futuro. Ao enfrentar esses desafios, o Brasil não apenas melhora a sua competitividade global, mas também promove um desenvolvimento econômico sustentável e inclusivo. A ação coordenada entre governo e iniciativa privada é fundamental para transformar essa visão em realidade, assegurando um futuro mais próspero para o país.
• Por: Luís Marques, CEO Brasil & Argentina da DB Schenker, líder global em soluções logísticas.