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20/06/2024

Copom mantém a taxa Selic em 10,50% ao ano, diz Banco Central

— O ambiente externo mantém-se adverso, em função da incerteza elevada e persistente sobre a flexibilização da política monetária nos Estados Unidos e quanto à velocidade com que se observará a queda da inflação de forma sustentada em diversos países. Os bancos centrais das principais economias permanecem determinados em promover a convergência das taxas de inflação para suas metas em um ambiente marcado por pressões nos mercados de trabalho. O Comitê avalia que o cenário segue exigindo cautela por parte de países emergentes.

Em relação ao cenário doméstico, o conjunto dos indicadores de atividade econômica e do mercado de trabalho segue apresentando dinamismo maior do que o esperado. A inflação cheia ao consumidor tem apresentado trajetória de desinflação, enquanto medidas de inflação subjacente se situaram acima da meta para a inflação nas divulgações mais recentes.

As expectativas de inflação para 2024 e 2025 apuradas pela pesquisa Focus encontram-se em torno de 4,0% e 3,8%, respectivamente.

As projeções de inflação do Copom em seu cenário de referência [a trajetória para a taxa de juros é extraída da pesquisa Focus e a taxa de câmbio parte de R$5,30/US$, evoluindo segundo a paridade do poder de compra (PPC). O preço do petróleo segue aproximadamente a curva futura pelos próximos seis meses e passa a aumentar 2% ao ano posteriormente. Além disso, adota-se a hipótese de bandeira tarifária “verde” em dezembro de 2024 e de 2025. O valor para o câmbio foi obtido pelo procedimento, que passou a ser adotado na 258ª reunião, de arredondar a cotação média da taxa de câmbio observada nos dez dias úteis encerrados no último dia da semana anterior à da reunião do Copom] situam-se em 4,0% em 2024 e 3,4% em 2025. As projeções para a inflação de preços administrados são de 4,4% em 2024 e 4,0% em 2025. Em cenário alternativo, no qual a taxa Selic é mantida constante ao longo do horizonte relevante, as projeções de inflação situam-se em 4,0% para 2024 e 3,1% para 2025.

O Comitê ressalta que, em seus cenários para a inflação, permanecem fatores de risco em ambas as direções. Entre os riscos de alta para o cenário inflacionário e as expectativas de inflação, destacam-se (i) uma maior persistência das pressões inflacionárias globais; e (ii) uma maior resiliência na inflação de serviços do que a projetada em função de um hiato do produto mais apertado. Entre os riscos de baixa, ressaltam-se (i) uma desaceleração da atividade econômica global mais acentuada do que a projetada; e (ii) os impactos do aperto monetário sincronizado sobre a desinflação global se mostrarem mais fortes do que o esperado. O Comitê avalia que as conjunturas doméstica e internacional seguem mais incertas, exigindo maior cautela na condução da política monetária.

O Comitê monitora com atenção como os desenvolvimentos recentes da política fiscal impactam a política monetária e os ativos financeiros. O Comitê reafirma que uma política fiscal crível e comprometida com a sustentabilidade da dívida contribui para a ancoragem das expectativas de inflação e para a redução dos prêmios de risco dos ativos financeiros, consequentemente impactando a política monetária.

Considerando a evolução do processo de desinflação, os cenários avaliados, o balanço de riscos e o amplo conjunto de informações disponíveis, o Copom decidiu manter a taxa básica de juros em 10,50% ao ano, e entende que essa decisão é compatível com a estratégia de convergência da inflação para o redor da meta ao longo do horizonte relevante, que inclui o ano de 2025. Sem prejuízo de seu objetivo fundamental de assegurar a estabilidade de preços, essa decisão também implica suavização das flutuações do nível de atividade econômica e fomento do pleno emprego.

A conjuntura atual, caracterizada por um estágio do processo desinflacionário que tende a ser mais lento, ampliação da desancoragem das expectativas de inflação e um cenário global desafiador, demanda serenidade e moderação na condução da política monetária.

O Comitê, unanimemente, optou por interromper o ciclo de queda de juros, destacando que o cenário global incerto e o cenário doméstico marcado por resiliência na atividade, elevação das projeções de inflação e expectativas desancoradas demandam maior cautela. Ressalta, ademais, que a política monetária deve se manter contracionista por tempo suficiente em patamar que consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas. O Comitê se manterá vigilante e relembra, como usual, que eventuais ajustes futuros na taxa de juros serão ditados pelo firme compromisso de convergência da inflação à meta.

Votaram por essa decisão os seguintes membros do Comitê: Roberto de Oliveira Campos Neto (presidente), Ailton de Aquino Santos, Carolina de Assis Barros, Diogo Abry Guillen, Gabriel Muricca Galípolo, Otávio Ribeiro Damaso, Paulo Picchetti, Renato Dias de Brito Gomes e Rodrigo Alves Teixeira— conclui o comunicado do BC.

Firjan — A manutenção da taxa de juros em 10,5% prejudica a recuperação da economia, limitando a expansão dos investimentos, diz Firjan. — A Federação das Indústrias do Rio Janeiro defende a estabilização da dívida pública, com um rigoroso controle dos gastos obrigatórios.

Para a Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan), ainda que esperada, a decisão de manter a taxa básica de juros, Selic, em 10,5% ao ano prejudica a recuperação de importantes setores econômicos do país. Esse patamar elevado continua a limitar a expansão dos investimentos. Ademais, a indústria, entre os três principais setores que compõem o PIB, foi a única a apresentar desempenho negativo no último trimestre.

Os dados mais recentes reforçam a falta de dinamismo no setor, evidenciando a necessidade de uma política monetária mais favorável ao crescimento econômico. Nesse contexto, a Firjan ressalta a importância de fortalecer a reputação das instituições responsáveis pela política econômica brasileira.

No âmbito fiscal, é crucial estabilizar a dívida pública por meio de uma agenda rigorosa de controle dos gastos obrigatórios, garantindo o cumprimento do arcabouço fiscal. No âmbito monetário, é essencial preservar a autonomia do Banco Central (BC) para assegurar maior previsibilidade e transparência na condução da política monetária. Somente assim será possível alinhar as expectativas de inflação à meta, permitindo taxas de juros mais baixas, o que revitalizará a confiança do setor produtivo e impulsionará o crescimento sustentável da atividade econômica.

Banco Daycoval — A decisão pela manutenção dos juros era esperada pelo mercado. Na avaliação do economista-chefe do Departamento de Pesquisa Econômica do Banco Daycoval, Rafael Cardoso, essa pausa nos cortes de juros veio dentro das expectativas e o que gerava maior inquietação era sobre a unanimidade nesta decisão, o que também aconteceu e contribui para uma redução nos riscos sobre política monetária. Cardoso, avalia que o comunicado trouxe boas perspectivas.

— O Copom deixa claro um cenário alternativo da manutenção da taxa Selic, o que a gente também considera importante, pois isso é como se fosse uma forma do Banco Central dizer qual pode ser, eventualmente, o plano de voo. E quando a gente olha as projeções desse cenário alternativo, que seria a manutenção dos juros no patamar atual no horizonte relevante, o que a gente vê é que a inflação projetada para 2025 fica muito próxima à meta, um pouquinho acima. Nas nossas estimativas, isso leva a inflação de 2026 para baixo da meta— explica Cardoso.

Para o economista-chefe do Banco Daycoval, o cenário posto, caso se mantenha, pode inclusive garantir um eventual corte de juros em 2025. No entanto, Cardoso aponta que aspectos do comunicado indicam para a interrupção do ciclo de cortes e não uma pausa. Além disso, o BC destaca ainda que seu compromisso é com a meta de inflação e que não estão descartadas elevações nos juros.

A projeção do Banco Daycoval para a Selic em 2024 é de 10,50% ao ano e para 2025 9,5% ao ano.

Ibmec-RJ — O economista Gilberto Braga, professor de Economia do Ibmec Rio de Janeiro, aborda os impactos da decisão:

— A decisão do Copom de manter a taxa em 10,5%, confirma as expectativas do mercado, que em sua quase totalidade, apostava nessa posição. Mas de certa maneira, surpreende pela unanimidade. O mercado não tinha necessariamente convicção de que haveria um placar da maneira que foi. Esperava-se que pelo menos alguns dos membros indicados pelo governo Lula ainda votassem por uma queda de 0,25 pontos percentuais, o que acabou não ocorrendo. A decisão do Copom, no certo sentido, confirma a percepção de que o presidente Lula está, de certa maneira, mal informado sobre o comportamento da economia brasileira. E se não é uma decisão que o mercado gosta, é uma decisão que o mercado entende como necessária e ao mesmo tempo que deve fortalecer a posição do ministro Fernando Haddad nas discussões sobre corte de gastos e o atingimento de meta fiscal — conclui Gilberto Braga, professor de Economia do Ibmec-RJ.

CNI — A Confederação Nacional da Indústria (CNI) considera inadequada e excessivamente conservadora a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central de interromper o ciclo de cortes na Selic, mantendo-a em 10,5% ao ano. Isso porque, neste momento, a decisão só irá impor restrições adicionais à atividade econômica — com reflexos negativos sobre o emprego e a renda —, sem que o quadro inflacionário exija tamanho sacrifício.

—A manutenção do ritmo de corte na Selic seria o correto, pois contribuiria para mitigar o custo financeiro suportado pelas empresas e pelos consumidores, sem prejudicar o controle da inflação— defende o presidente da CNI, Ricardo Alban.

Com a Selic mantida em 10,5%, a taxa de juros real (que desconsidera os efeitos da inflação esperada para os próximos 12 meses, que é de 3,6%) fica em 6,64%, ou seja, 2,14 pontos percentuais acima da taxa de juros real neutra — aquela que não estimula nem desestimula a atividade econômica, estimada pelo Banco Central em 4,5% ao ano. Importante salientar que a taxa de juros real do Brasil é a segunda maior do mundo, atrás apenas da taxa da Rússia.

Vale também observar que, mesmo se o Copom tivesse reduzido a Selic em 0,25 ponto percentual, o que seria o mais adequado, a taxa de juros real estaria em 6,4% ao ano, ou seja, 1,9 ponto acima da taxa de juros real neutra, ainda denotando política monetária fortemente contracionista.

O que acontece com o PIB? Os prejuízos dessa política monetária são claros ao analisarmos o comportamento da atividade econômica. As previsões apontam que o crescimento do PIB deve ser menos intenso este ano do que foi no ano passado: em 2023, o crescimento observado foi de 2,9%, enquanto para 2024 a previsão, segundo o Relatório Focus, é de 2,08%.

Além disso, o Fundo Monetário Internacional (FMI) projeta que o Brasil deve crescer menos do que os demais países em desenvolvimento. Para o FMI, enquanto o PIB brasileiro deve crescer 2,2% em 2024, nos países em desenvolvimento o crescimento do PIB deve ser de 4,2%, em média.

Quanto ao comportamento da inflação, deve-se frisar que a aceleração em maio, assim como a elevação das expectativas para 2024 nas últimas semanas, ainda são movimentos muito recentes e, por isso, não configuram mudança estrutural na dinâmica dos preços. Logo, não justificam a equivocada interrupção na trajetória de queda na Selic.

Desde outubro de 2023, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) vinha desacelerando mês após mês. O IPCA acumulado em 12 meses até abril de 2024 foi de 3,7%, bem abaixo do índice acumulado em 12 meses até dezembro de 2023, de 4,6%. Somente em maio último é que o índice acumulado em 12 meses acelerou para 3,9%.

Convém registrar que o grupo alimentação foi responsável por quase 1/3 da variação observada em maio, reforçando o fato de o movimento recente da inflação contar com aspectos específicos que não caracterizam um quadro claro e definitivo de aceleração.

De maneira semelhante, destaca-se que as expectativas de inflação para o fim de 2024 estavam em queda e chegaram a 3,7% em abril. Agora, voltaram a crescer e atingiram 3,96% na publicação do último Relatório Focus. A expectativa é de que o IPCA de 2024 termine em nível menor que o observado em 2023 e dentro do teto da meta para este ano, de 4,5%.

Importante lembrar que esses movimentos recentes podem ser revertidos pela taxa de juros real no campo contracionista – mesmo se a Selic tivesse sido cortada em 0,25 —, pelo início do processo de redução da taxa de juros nos Estados Unidos, esperado para o segundo semestre, e pela evolução das discussões sobre controle de despesas públicas.