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27/01/2024

A queda de braço continua em 2024: Home office ou presencial?

O mercado de trabalho tem sofrido transformações estruturais aceleradas em seu modelo de atuação, na liderança de multigerações e, até mesmo, no engajamento de seus colaboradores. Se contratar talentos tem sido uma tarefa cada vez mais desafiadora para as organizações, independentemente do porte e nacionalidade, manter os profissionais motivados e alinhados com o propósito da empresa é uma preocupação não apenas das áreas de recursos humanos e gestão, mas também do alto escalão. Esses são temas tratados nos principais conselhos de administração, já que é por meio das pessoas que os resultados são conquistados.

Após a pandemia da Covid-19, onde muitas organizações foram obrigadas a manter seus colaboradores trabalhando em home office, o modelo de poder e controle, ou seja, aquele em que o líder ficava vigiando o que cada funcionário fazia durante o expediente de trabalho caiu por terra, ganhando força o modelo de performance e de gestão a distância, o que exigiu novas competências e habilidades das lideranças. Afinal, era e continua sendo preciso uma gestão muito mais assertiva, eficiente e eficaz, com colaboradores que, em muitas vezes, estão trabalhando de localizações distintas. Ao longo do dia era comum os líderes questionarem porquê o funcionário não estava em sua mesa, porquê ele tomava tanto café ou, até mesmo, a que horas chegava ou saía; não é verdade?

Em 2022, o influente dono da Tesla, Spacex e do X (ex-Twitter), Elon Musk, declarou que times em home office fingem que trabalham. A grande pergunta que fica é: e as lideranças, fingem que lideram? Será que os executivos ao redor do mundo de fato estão preparados para os novos tempos, liderando pessoas com perfis, idades, desejos e propósitos muitas vezes distintos? Ser um líder não é uma tarefa simples, pois é preciso orquestrar projetos, processos, pessoas e milhares de variáveis externas que afetam o dia a dia da corporação e seus resultados. Para além do glamour de sentar-se em uma cadeira de gestão, cada vez mais será exigido aos líderes que façam de fato a real diferença na empresa e na vida das pessoas.

Muitas lideranças, com práticas atrasadas têm tentado, forçadamente, adaptar-se ao moderno conceito de gestão por performance, já que não é mais possível ter controle dos colaboradores em casa. O mundo pede leveza e esse mesmo conceito precisa ser aplicado dentro das organizações. Para ser um líder eficiente, no mínimo, é preciso engajar as pessoas e estabelecer laços de confiança. A gestão pelo medo e pelo controle já caiu em desuso há tempos. Usualmente, quem adota esse tipo de gestão atrasada são lideranças com baixa autoestima, falta de confiança, além de ausência de delegação e, até mesmo, de controle emocional.

O número de trabalhadores que atuam no modelo home office, seja parcial ou integral, tem potencial para ser quase duas vezes maior do que o atual, acima de 20 milhões. É o que indicou um recente estudo sobre o tema produzido pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Ao mesmo tempo, a pesquisa sinalizou que as empresas têm enxergado ganho de produtividade com o modelo. Na análise, a parcela de companhias que admitiram ganho produtivo com esse perfil de trabalho foi maior que a fatia que informou diminuição de produtividade com o trabalho em casa. No levantamento “Resultados sobre trabalho no domicílio”, a projeção é que cerca de 23 milhões de funcionários no Brasil têm desejo de trabalhar em casa, de forma parcial ou total. Isso representaria em torno de 35,7% dos 65 milhões de trabalhadores brasileiros que não são empregadores, familiares, auxiliares ou conta própria no país.

O tema sobre o home office ainda divide opiniões. Mas uma coisa é certa: não há fórmula mágica ou uma receita única. Cada caso precisa ser analisado, entendido e estruturado conforme a realidade de cada companhia e de cada nível hierárquico do profissional em questão. Há inúmeros casos de empresas que aumentaram seu faturamento, reduziram custos, melhoraram o clima organizacional e ficaram mais atrativas. Melhores talentos, diferentemente do passado, decidem se querem ou não trabalhar em determinado lugar, de acordo com seus objetivos e propósitos. O poder está compartilhado: as empresas e os profissionais escolhem.

A queda de braço tem variado de acordo com os momentos, entre empresas e profissionais. Se durante a pandemia percebia-se no mercado de trabalho a escassez de mão de obra, muito profissionais diferenciados estavam sendo fortemente abordados por empresas que flexibilizaram modelos de atuação (home office ou híbrido), além de excelentes pacotes de remuneração para não perde-los; hoje com as inúmeras demissões (layoffs) afetando os setores de tecnologia e startups principalmente, muitas empresas têm exigido o retorno se não totalmente presencial, pelo menos três e até quatro dias por semana. Nesse momento, a balança dessa disputa tem estado do lado das empresas.

É importante ser estratégico para avaliar quem pode estar em casa e quem não pode, uma vez que existem atividades em que o home office não é possível. Todavia, para aqueles em que esse modelo é viável, é muito interessante adotar, no mínimo, o formato híbrido, ou seja, o profissional fica alguns dias em casa e, em outros, vai à corporação. As empresas que não estiverem atentas a esse novo desejo dos profissionais, deixarão escapar seus melhores talentos para o seu concorrente, que proporcionará isso a eles. É perceptível corporações perderem a atração para diversos candidatos a um cargo, quando não há a possibilidade de teletrabalho.

O home office trouxe diversas possibilidades que antes não eram possíveis, como a diversificação de contratações para além de onde a empresa está fisicamente. E muitos gostaram e se adaptaram. É preciso analisar caso a caso, posição por posição, setor por setor, mas, sobretudo, questionar constantemente o papel dos líderes e sua respectiva gestão, independentemente do modelo adotado.

A preocupação de algumas empresas é o distanciamento dos colaboradores que estão home office ou no modelo híbrido, da cultura organizacional. Trabalhar remotamente não impede a construção de uma cultura forte da organização, porque essa é o resultado do que as pessoas pensam, sentem e fazem no dia a dia, presencialmente ou virtualmente. Vale destacar que cultura é diferente de clima organizacional.

Há muitos ganhos positivos na adoção do home office, seja para as empresas, seja para os colaboradores. Do lado do empregado, ficou evidente que melhorou a qualidade de vida, a partir do momento em que ele não precisa mais se deslocar para o trabalho. Assim, pode empreender esse tempo em que estaria no trânsito para fazer exercícios físicos em casa ou mesmo adiantar as tarefas diárias, bem como estar mais presente junto aos seus familiares.

Para quem trabalha home office, é preciso estar atento para conseguir equilibrar sua saúde mental por conta do isolamento social presencial. É de vital importância planejar bem o tempo dedicado ao campo profissional e ao pessoal. Estabelecer horários para os seus afazeres, como acordar, se alimentar, trabalhar e demais atividades extras, buscando uma lógica que atenda às duas demandas. Procure se vestir com roupa confortável, adequada ao trabalho, afinal todos nós representamos uma marca e a forma como nos vestimos, pode, inclusive, afetar nossa imagem profissional. Praticar algum tipo de atividade física é importante para quem atua home office, como pilates, yoga, exercício aeróbico, funcional, alongamentos. Quando nos exercitamos, naturalmente, a ansiedade e o estresse são amenizados. Além disso, fortalece as articulações, ossos e músculos, reduzindo o cansaço, evitando dores no corpo, melhorando, inclusive, o humor, a qualidade do sono e a autoestima, entre outros benefícios.

Fato é que as discussões sobre os pontos positivos e negativos do home office seguirão ao longo de 2024, mas é de vital importância repensar os modelos de gestão e as competências e habilidade das lideranças. O que nos trouxe até aqui, certamente não nos levarão aos próximos tempos. Não cabe mais decisões autocráticas em ambientes onde busca-se estimular a inovação, a criatividade, a diversidade e a conexão com o propósito. Felicidade no trabalho, fato já comprovado por inúmeras pesquisas, afeta diretamente no faturamento da organização. Culpar a improdutividade para uma tomada de decisão de retorno 100% presencial é isentar o trabalho que os líderes precisam fazer. Por outro lado, conhecer, em detalhes, seus liderados, gerenciando de forma única cada um (presencialmente ou virtualmente) e repensando novas formas de trabalho, de gestão e engajamento pode fazer a diferença e para melhor.

. Por: David Braga,CEO, board advisor e headhunter da Prime Talent, empresa de busca e seleção de executivos, presente em 30 países pela Agilium Group; É Conselheiro de Administração e Professor convidado pela Fundação Dom Cabral e Conselheiro da ABRH MG, ACMinas e ChildFund Brasil. É também autor do livro “Contratado ou demitido, só depende de você”.