E já contabiliza prêmios internacionais. Com apoio de pesquisadores, produtores paulistas adaptaram os parreirais para o clima da região, resultando na melhora da qualidade da bebida produzida no Estado de São Paulo.
Os vitivinicultores paulistas estão colhendo agora os frutos de um trabalho iniciado há 20 anos, quando adotaram a técnica da dupla poda das videiras. Prática adotada em toda a região sudeste do País, a partir dos estudos do pesquisador da EPAMIG, Murillo de Albuquerque Regina. O método consiste na inversão do ciclo da videira pela realização de duas podas anuais, o que possibilita que o período de maturação e de colheita das uvas aconteça no inverno, período com menor incidência de chuvas e elevada amplitude térmica — diferença de temperatura entre o dia e a noite.
—Nunca estivemos numa fase tão boa quanto agora —comemora Célia Carbonari, presidente da Câmara Setorial de Vitinicultura, Vinho e Derivados, ligada à Secretaria de Agricultura e Abastecimento de São Paulo. Célia está colhendo os louros dessa mudança, recentemente, dois vinhos produzidos na vinícola de sua família, a Villa Santa Maria, que fica em São Bento do Sapucaí, foram premiados internacionalmente. O Brandina Assemblage 2020 e o Brandina Sauvignon Blanc 2021 conquistaram medalhas de prata no Decanter World Wine Awards 2023, concurso que avaliou mais de 18 mil rótulos do mundo todo. —Produzimos vinho de qualidade com características únicas, num mercado consumidor crescente, mas enfrentamos grandes desafios no setor, que impedem que a vitinicultura no Brasil se consolide —revela Celia.
Para o coordenador das Câmaras Setoriais da SAA, José Carlos Faria Junior, a Câmara tem se destacado como um órgão fundamental na promoção e fortalecimento do setor vitivinícola do estado. —Com seu funcionamento ativo e foco em objetivos claros, ela desempenha um papel crucial no apoio à indústria da uva e do vinho, os planos incluem o fomento ao enoturismo, a promoção de políticas que fortaleçam a cadeia produtiva, o mapeamento das vinícolas do estado e a análise de possíveis incentivos fiscais para a bebida produzida em São Paulo. Além disso, busca valorizar a diversidade do setor, reconhecendo a qualidade tanto dos vinhos de mesa quanto dos finos, isso é um exemplo de organização —ressalta Faria.
Para a empresária, a bebida paulista enfrenta uma concorrência desleal, tanto pela carga tributária, quanto pelo “descaminho”, como é chamada a entrada ilegal de vinhos argentinos e chilenos no Brasil. Ela explica que o vinho paulista sofre uma incidência de impostos de aproximadamente 42%, já no Rio Grande do Sul, principal produtor de vinho de mesa do País, essa tarifação não ultrapassa os 12%. —Nosso vinho tem qualidade, mas o preço não se torna atrativo e não temos incentivos, como uma linha de crédito específica para o setor— ressalta.
Ela explica, que apesar vitivinicultura em São Paulo não ser tão significativa para o Estado, quanto a de culturas tradicionais, como cana-de-açúcar e laranja, esse é um mercado que movimenta outros dois setores, o de serviços e comércio. As chamadas vinícolas gourmets, normalmente, constroem complexos com restaurante e loja com produtos próprios e locais. —A região toda ganha, como a rede hoteleira que recebe os turistas— afirma Célia.
Assim como o vinho brasileiro tem ganhado cada vez mais adeptos, o setor tem atraído cada vez mais investidores. Para se ter uma ideia, segundo Célia, 40 vinícolas estão sendo formadas nas regiões de Espírito Santo do Pinhal, São Roque, Jundiaí, Louveira e Indaiatuba. —São pequenas vinícolas boutiques, resultado do investimento de empresários de diferentes áreas, apreciadores de vinho que sonham em ter seu próprio negócio, como se fosse uma volta às origens —explica. Isso se reflete nos números de produção no campo, pois o volume de pés novos saltou de 7,85 mil, em 2022, para 63,95 mil este ano, segundo levantamento do Instituto de Economia Agrícola (IEA-APTA). Esse aumento será sentido na cadeia produtiva do vinho em três ou quatro anos, quando for realizada a colheita da primeira safra.
Um outro gargalo do setor, também levantado durante os encontros da Câmara Setorial, é a produção de mudas de uvas viníferas. —Tem vitivinicultor que espera até três anos por determinadas variedades. Atualmente, temos poucos produtores de mudas, que não atendem a demanda do Estado — explica Marcos Augusto Franco Junior, diretor técnico da Divisão de Mudas, da CATI Sementes e Mudas. No Estado de São Paulo, existem 321 vinícolas cadastradas, que produzem entre dois e cinco hectares de uvas viníferas. Segundo Franco, para atender este mercado, são necessárias quatro milhões de mudas por ano.
Atento a esse problema, juntamente com o IAC, a Cati Sementes e Mudas implementou, há cinco anos, um sistema produtivo, que neste ano, já prevê a produção e fornecimento de dez mil brotos. —Em quatro anos, a meta é oferecer ao mercado entre 100 a 150 mil mudas por ano, revela Franco. O objetivo da CATI é fornecer mudas de alta qualidade e material de propagação com origem genética comprovada, em quantidade suficiente para aumentar os plantios de uvas de mesa e a produção de vinhos finos no Estado de São Paulo..
Para atender esse apelo da cadeia produtiva do vinho, de ter mais variedades disponíveis, o IAC também faz estudos em propriedades agrícolas com enxertos e clones comerciais, com foco na adaptação de uvas europeias. —Estamos trabalhando para oferecer ao produtor o que ele precisa. Nossa missão é fazer o licenciamento e ter mudas de uvas para produção de vinhos finos e disponibilizar para o produtor —afirma a pesquisadora Dra. Mara Fernandes Moura.
Para o secretário de Agricultura e Abastecimento, Guilherme Piai, essas iniciativas promovem o crescimento sustentável e a competitividade do setor, contribuindo para a qualidade e a inovação na produção de uvas e vinhos em São Paulo. —A Secretaria tem papel crucial nesse desenvolvimento, oferecendo suporte técnico por meio da extensão rural, conduzindo pesquisas para aprimorar a produção e dialogando na Câmara Setorial da Vitivinicultura —afirma Piai.
vinhos agroecológicos —A unidade de pesquisa da Apta Regional desenvolveu um projeto com uvas orgânicas. Trata-se do primeiro vinhedo comercial, livre de defensivos químicos, instalado no município de São Roque. O objetivo do projeto é valorizar a produção local e visa atender a demanda dos produtores rurais do município, que querem aumentar o cultivo de uva, aliado a demanda do mercado consumidor por produtos mais sustentáveis. —Os visitantes procuravam sucos e vinhos orgânicos nas vinícolas de São Roque e em 2021 passamos a oferecer a variedade IAC Ribas— explica o pesquisador da Apta Regional, Wilson Tivelli.