Brasil e Portugal têm relações que vão muito além de suas raízes e dimensões históricas. Existe uma irmandade política que se plolifera para diversos segmentos nos campos econômicos, de tecnologia, cultural, educacional e jurídico. Inicialmente, em matéria de Direito Penal, é importante frisar a existência do Tratado de Extradição entre o Governo da República Portuguesa e o Governo da República Federativa do Brasil, em virtude dos laços de amizade e cooperação internacional.
O Tratado dispõe expressamente no artigo 1 sobre as “Obrigações de extraditar”, em que ambos os países pactuam a reciprocidade e obrigação legal de extraditar um indivíduo que tenha prisão preventiva expedida em um procedimento criminal ou prisão para cumprimento de pena, oriunda de uma condenação penal transitada em julgado, perante o Tribunal do país requerente do pedido.
Já no Artigo 2 do Tratado consta expressamente os “Fatos determinantes da extradição”, quais sejam:
a) Fatos puníveis de acordo como a legislação dos dois países, a pena privativa de liberdade com pena máxima superior a 1 ano, evitando-se assim o pedido de extradição para crimes de menor potencial ofensivo;
b) Quando for para cumprimento de pena privativa da liberdade, apenas se a pena ainda a cumprir for superior a 9 meses;
c) Na determinação das infrações segundo a lei de ambas as partes contratantes, todos os fatos imputados à pessoa cuja extradição é pedida serão considerados, sendo irrelevante a circunstância de serem ou não elementos constitutivos da infração ou utilizem a mesma ou diferente terminologia legal.
Uma questão muito importante é o princípio da territorialidade, disposto no Artigo 2, número 4, do Tratado, em que consta que se a infração que deu origem ao pedido de extradição tiver sido executada fora do território do país requerente do pedido, a extradição só será concedida se:
a) a pessoa alvo do pedido de extradição seja de nacionalidade do país requerente do pedido;
b) Se a lei do país requerido do pedido de extradição disponha expressamente na lei a hipótese de punição de um crime cometido fora do país, em condições análogas.
O Tratado dispõe também, em seu artigo 3, expressamente os casos de inadmissibilidade da extradição (a ser analisada em caráter preliminar ao mérito, e caso não forem preenchidos culminará no julgamento pela parte requerida, conforme preceitua o Artigo 4), quais sejam:
i) Se a pessoa alvo do pedido de extradição ter nacionalidade no país requerido. Nesse caso, salta aos olhos que se o Brasil requerer a extradição de um cidadão com dupla nacionalidade (portuguesa e brasileira), a extradição não preenche os requisitos de admissibilidade;
ii) Se a infração penal objeto do pedido de extradição tiver sido cometida no território nacional da país requerido. Ou seja, neste caso, a pessoa deverá ser alvo de uma investigação e de uma eventual ação penal pelos fatos praticados perante as leis do país em que praticou atos contrários a Lei, inexistindo nesse caso extradição para um outro país onde sequer praticou qualquer ato ilegal;
iii) Ter a pessoa reclamada sido julgada definitivamente no país requerido ou em um terceiro Estado pelos mesmos fatos objeto do pedido de extradição e ter sido absolvida ou cumprido pena em virtude de eventual condenação. Nesse caso, prospera a proibição do princípio do Bis in Idem;
iv) Se no momento da recepção do pedido de extradição, estiver extinto o procedimento criminal ou a pena, por prescrição ou qualquer outra causa, segundo a Lei de qualquer dos países;
v) Ser a infração punível com pena de morte ou prisão perpétua, ou estar a infração alvo de anistia;
vi) Haver fundadas razões de que a pessoa alvo do processo de extradição não fará jus a garantias de um processo criminal justo, que respeite os direitos humanos e o cumprimento da pena que não seja em presídios com situação desumana e degradante;
vii) Ser o crime de natureza política ou conexa, ou crime militar que não constitua simultaneamente nas duas legislações crime comum;
viii) Haver fundadas razões para concluir que a extradição é baseada somente em virtude de raça, sexo, religião, nacionalidade ou convicções políticas, sendo a pessoa por isso prejudicada.
No caso de os requisitos de admissibilidade estarem preenchidos, o processo de extradição terá o julgamento do mérito, onde a parte alvo do processo de extradição poderá oferecer oposição ao processo de extradição, em grau de recurso até o trânsito em julgado do procedimento.
No mérito, dispõe o Artigo 5 do Tratado os casos de recusa do pedido de extradição:
a) Se a parte requerida tiver decidido abster=se de instaurar procedimento criminal pela infração que deu lugar ao pedido de extradição contra pessoa que for alvo do pedido;
b) Se a pessoa cuja entrega é solicitada tiver sido condenada à revelia pela infração que originou o pedido de extradição, em virtude da afronta ao princípio da ampla defesa, contraditório, devido processo legal e da busca da verdade real dos fatos, exceto se a Lei da parte requerente assegurar a possibilidade de recurso da decisão ou realização de um novo julgamento justo após a extradição;
c) Se a pessoa requerida do pedido de extradição estiver respondendo investigação policial ou ação penal no país requerido pelos mesmos factos objetos do pedido de extradição;
O princípio da especialidade possui bastante importância em casos de extradição e, conforme dispõe expressamente o Artigo 6 do Tratado, uma pessoa extraditada ao abrigo do referido Tratado não pode ser detida ou julgada e nem sujeita a medida de coação de prisão no território do país requerente do pedido, por qualquer fato distinto do que motivou a extradição e lhe seja anterior ou contemporâneo.
Entretanto, isto não vale excepcionalmente, de forma taxativa, quando a parte requerida, ouvido previamente o extraditado, der o seu consentimento na sequência da apreciação de pedido nesse sentido apresentado e decidido nos termos previstos para o pedido de extradição. Ou quando o extraditado, tendo direito e possibilidade de sair do território do país requerente do pedido, nele permanecer por mais de 45 dias ou voluntariamente regressar.
Importante também a análise do Artigo 8, que dispõe expressamente dos pedidos de extradição concorrentes. Ou seja, no caso de existir diversos pedidos de extradição de uma mesma pessoa pelos mesmos fatos terá preferência o Estado em cujo território a infração se consumou ou onde foi praticado o fato principal.
Entretanto, se os fatos forem distintos, no caso de infrações de gravidade diferente, prospera o pedido relativo à infração mais grave, de acordo com a lei do país requerido. E no caso de infrações de igual gravidade, o pedindo mais antigo.
Por fim, não se pode olvidar o Artigo 11, que dispõe expressamente sobre os requisitos do pedido de extradição, ou seja, o pedido de extradição deve incluir: a identificação da pessoa reclamada; a menção expressa de sua nacionalidade; a prova de que no caso em concreto a mesma pessoa está sujeita à jurisdição penal do país requerente; a prova no caso da infração cometida em terceiro Estado, de que este não reclama o extraditando por causa dessa infração; A informação, nos casos de condenação á revelia, de que a pessoa reclamada pode recorrer da decisão ou requerer novo julgamento após a efetivação da extradição.
Portanto, conclui-se a importância de um advogado criminalista especialista para defender os interesses de uma pessoa alvo de um processo de extradição, para exercer a advocacia técnica no referido processo e avaliar questões que podem culminar na recusa da extradição. Muitas vezes os pequenos detalhes podem culminar na vitória da causa, como, por exemplo, a análise do princípio da dupla incriminação; se as documentações enviadas de um país para o outro possuem autenticidade; os prazos legais para envios de documentos; a análise da garantia dos direitos humanos, fundamentais e do sistema prisionais e todos os artigos supra mencionados; análise das vias diplomáticas exercidas no caso em concreto; e sobretudo conhecimento acerca das jurisprudências pátrias sobre os casos em concreto e trabalhar em conjunto e paralelo o processo crime que deu origem ao processo de extradição.
. Por: Eduardo Maurício, advogado no Brasil, em Portugal e na Hungria. Doutorando em Direito – Estado de Derecho y Governanza Global (Justiça, sistema pena y criminologia), pela Universidad D Salamanca – Espanha. Mestre em direito – ciências jurídico criminais, pela Universidade de Coimbra/Portugal. Pós-graduado pela Católica – Faculdade de Direito – Escola de Lisboa em Ciências Jurídicas. Pós-graduado em Direito penal econômico europeu, em Direito das Contraordenações e em Direito Penal e Compliance pela Universidade de Coimbra/Portugal. Pós-graduado pela PUC-RS em Direito Penal e Criminologia. Pós-graduando pela EBRADI em Direito Penal e Processo Penal. Pós-graduado pela CBF (Confederação Brasileira de Futebol) Academy Brasil –em formação para intermediários de futebol. Mentor em Habeas Corpus. Presidente da Comissão Estadual de Direito Penal Internacional da Associação Brasileira de Advogados Criminalistas (Abracrim). Membro da Association Internationale de Droit Pénal (AIDP) – International Association Penal Law. Membro da Associação Internacional de Direito Penal de Portugal (AIDP – PT) – International Association Penal Law – PT. Intermediário oficial da Federação Portuguesa de Futebol (FPF).